11 de dez. de 2013

Artigo: Juiz musical

Quantas vezes você já não se pegou dizendo “brega é horrível”, “forró é deplorável”, “emocore é ridículo”? Eu já me peguei várias vezes pensando nisso até chegar a uma conclusão que deveria ser inevitável a todos: “quem sou eu para afirmar isto?”. A nossa mente é tomada por um egocentrismo tão grande, isto é, a incapacidade natural humana de transpor a capacidade de análise para fora das nossas cabeças, que achamos completamente plausível criticar um estilo musical dissonante dos de nossos gostos.

         Pois bem, temos liberdade para ter afinidades musicais. Além de ser um traço cultural bastante forte, é sabido do poder de a música estimular certas regiões do cérebro. Para algumas pessoas ouvir forró libera serotonina (o hormônio da felicidade), para outras, ouvir heavy metal libera endorfina (um hormônio indutor de sensação de relaxamento). Sabe-se, ainda, do fato de muitas pessoas levarem a música como um estilo de vida. É meu caso. Tenho som no carro, no computador, no celular, em tudo que puder colocar, até na cabeça. Em geral, o público do rock, assim como eu, é aficionados em música. E isto é legal.

         O que não é bacana é quando nós não conseguimos entender isto no outro. Quando chamamos o metal core de “merdacore”, quando julgamos o brega de “ridículo”, o forró de “risível” e o sertanejo de outros adjetivos piores. Óbvio, dentro da sua cabeça você pode manter os adjetivos que achar adequados, no entanto, quando começam os ataques pessoais, a coisa fica diferente. Em geral, esses pensamentos tem a necessidade gritante de ser externados por pessoas que não suportam certos estilos musicais e, por isso, precisam denegrir as pessoas que dele gosta.

         Você é livre para gostar do que quiser, e de não gostar do que quiser, mas lembre do seu teto de vidro antes de atirar a primeira pedra. Citemos por exemplo algum fã do estilo thrash metal. Ele adora Metallica, adora Megadeth, Slayer, Pantera. Ele não suporta Avenged Sevenfold (eu também não, mas não me incluo no que citarei) e chama os fãs da banda de idiotas, de emozinhos, de chorões, de coisas depreciativas somente por não gostar do estilo da banda. Pensemos do ponto de vista dos fãs do Avenged Sevenfold: os caras do thrash metal são uns agressivos, violentos, só falam de porrada, sangue e guerra. Quem está errado? Óbvio que os dois.


         Eu entendo, antropologicamente, que o ser humano adore rótulos, pois estes são regularidades e o ser humano pensa usando estes artifícios. Tentemos, no entanto, nos desfazer dessas construções prontas, sem um teor de esforço cognitivo mínimo. Pensemos nas pessoas como indivíduos ricos em experiências, em conhecimento, em vida. Cada pessoa é um mundo. Vamos sair da zona de conforto e parar de denegrir as pessoas por não gostarem do mesmo do que gostamos? Vamos enxergá-las sem esse “satânico do Black Metal”, “agressivo do thrash metal”, “Suicida do Death Metal” ou “chorão do metalcore”? Isto é tudo uma construção desprovida de coerência.

         Vamos fortalecer o movimento do rock, sem rótulos, como gostaria Chuck Schuldiner (grande ídolo meu tanto pelos pensamentos como pela técnica e intuição musical). Em Santarém somos poucos, mas se deixarmos de lado nossas divergências musicais, aposto que engrossaremos a massa da luta pelo reconhecimento da nossa música. E assim estaremos mais propensos a convencer as pessoas de que nós não merecemos os rótulos de “garotos e garotas do mal”, “gente sem cristo no coração”, “os que ouvem música do diabo”. Sem antes pararmos de criar preconceitos e cerceamentos de acesso aos produtos do rock (eventos, músicas, conversas), nunca conseguiremos dar força ao movimento do nosso estilo.

         Um exemplo muito claro ocorreu com a banda Detroit de prainha que tocou no Circuito Rock ocorrido no dia 08 de dezembro. Eles foram hostilizados em uma rede social por supostos representantes do movimento heavy/thrash metal por tocarem uma variedade grande de estilos musicais e por tocarem músicas do Avenged Sevenfold (inclusive sendo acusados de serem “banda fuleira”). A argumentação foi tão fraca que acabei ficando com muita expectativa para ver o som dos caras. 

Não tive outra surpresa, o som foi inversamente proporcional ao teor das argumentações contra a banda, ou seja, a banda Detroit mandou um som excelente, com covers de Iron Maiden (Fear of the Dark), de Dio (Holy Diver), System of a Down (Aerials e BYOB) e até massacration. Massacration! Todos muito bem executados. Os integrantes têm técnica e carisma, logo foi muito bom ter sido racional e não ter me deixado levar pelo preconceito. E acho que é assim que devemos fazer.

 Por Glauco Cohen Ferreira Pantoja

Professor Assistente I da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa)
Doutorando em Ensino de Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Vocalista da Banda Cerbero de Hades e Guitarrista da Crush Bones


Edição: Andriene Moura

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